quinta-feira, 2 de maio de 2024

Inteligência humana

Viver em conjunto, mais de oito mil milhões de habitantes no planeta Terra, com tão poucos conflitos graves, sim, tão poucos, é uma dádiva que devemos agradecer aos nosso antepassados e ser capazes de preservar para o futuro.
Construir comunidades, que se formaram em espaços e tempos diferentes, que se foram descobrindo, que souberam resistir, melhor ou pior, a impulsos de conquista, de imposição de ideias, de crenças, de superioridade, descobrir outras comunidades, construir comunidades de comunidades, todas diferentes, cada uma com as suas tradições e com os seus valores, é um desafio de enorme dimensão.
Árvores...
Sendo certo que a superfície do planeta Terra se tem mantido mais ou menos constante, na verdade o número de habitantes tem crescido quase exponencialmente, ao mesmo tempo que o conhecimento e o domínio de tecnologias criou paradigmas de mobilidade e de comunicação que mudaram radicalmente o modo como as pessoas e as ideias se movem e propagam.
Vencidos os desafios da distância e do tempo, olhamos hoje para os desafios da informação e do conhecimento de uma forma radicalmente diferente, temos dado passos importantes na inteligência artificial, e estamos eventualmente nas vésperas da compreensão do essencial da inteligência humana.
Inteligência é a capacidade de interpretar, de prever, factos e comportamentos, de extrapolar, de criar, de modificar, de adaptar, de arriscar, e tem muito pouco a ver com a chamada aprendizagem automática, de que os computadores são capazes, tirando partido da sua capacidade de analisar sem fadiga um número infinitamente grande de situações.
Recordando Khaneman, "Thinking, fast and slow", nós, os humanos, somos capazes de tomar decisões rápidas, quando é preciso, e lentas quando tal se impõe.
Rede neuronal (imagem de Freepik)
O nosso cérebro será uma grande rede neuronal, em que as ligações físicas e químicas desempenham papeis fundamentais, e, hoje, líderes mundiais nestas áreas já apostam em componentes electrónicos baseados nestes conceitos vitais.
Falta saber qual a utilização que poderá ser dada a estas capacidades, se para bem da humanidade ou para a sua destruição, se seremos capazes de dobrar este Cabo da Boa Esperança, ou será este um Cabo das Tormentas.
Ainda não sabemos.

quarta-feira, 3 de abril de 2024

Amsterdam

Em 1972, era assistente eventual na FEUP, e fui destacado para acompanhar os alunos finalistas de Engenharia Electrotécnica na sua viagem de fim de curso, numa rota que incluía Inglaterra, Países Baixos (na altura, Holanda) e Bélgica.
O início da viagem coincidiu com uma reunião do chamado Grupo Português de Telecomunicações, na JNICT, que na altura secretariei, e a Faculdade concordou em pagar a minha viagem de avião até Londres, para me juntar ao grupo.
Curiosamente, a agência de viagens disse-me que era mais barato fazer a viagem Porto-Amsterdam com escala em Londres, e assim fiz.
Foto retirada da página do turismo dos Países Baixos
A minha bagagem seguiu no autocarro dos alunos, eu dei as minhas voltas e a meio da tarde fui até Heathrow, comprei o tradicional álcool na Free Shop, e apanhei o avião. Destino, Hotel Museum.
Em Schiphol, apresentei-me no controlo de passaportes, e o polícia de serviço pediu-me para lhe mostrar o bilhete de regresso.
Uau! Não tinha. E contei-lhe os factos. Um português, em 1972, sem bagagem, sem bilhete de regresso, a quer entrar na Holanda, com uma história de que ele não acreditou nem numa palavra...
Atendeu o resto da fila, e depois pediu-me que o acompanhasse ao gabinete.
Lá, expliquei mais uma vezes a minha situação, e ao fim de algumas tentativas consegui convencer um dos presentes a telefonar para o Hotel Museum, e confirmar as minhas palavras.
Alívio. O Hotel confirmou que estava à minha espera, e que até já lá estava o grupo.
Um dos polícias levou-me até ao transporte público, explicou-me a melhor maneira de chegar ao hotel, e despedimo-nos com um sorriso.
A triste imagem dos jovens portugueses, a tentar de todas as formas fugir de um regime que já se tornara insuportável. A minha qualidade de universitário tinha-me permitido pedir o adiamento da incorporação no serviço militar para o ano em que completasse 30 anos de idade, mas isso são outras histórias.

sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Dilemas I

A vida é feita de decisões, a maior parte delas aparentemente difíceis e irreversíveis.
Nós, que passamos pelo planeta Terra menos de dez décadas, em média, que somos um em oito mil milhões de habitantes vivos, ou um em cento e vinte mil milhões de habitantes passados e presentes, vivemos tempos dramáticos, como se tudo estivesse sobre os nossos ombros, como se cada decisão nossa pusesse em risco toda a humanidade.
É um facto que a evolução do planeta Terra e de todos os seres que nele habitam, depende das nossas decisões, actuais e passadas, de uma forma altamente complexa. Mas não só. 
Somos um pontinho no espaço.
A Terra e a Lua vistas da Cassini a orbitar em Saturno, a 1400 milhões de km, em 2017.
Mas sim, temos de tomar decisões, as melhores que soubermos, com o que sabemos.
Esta reflexão vem a propósito de uma conversa que segui hoje no X sobre o ensino das disciplinas básicas nos cursos universitários:
Devemos defender maior carga horária em disciplinas básicas porque elas que vão permitir que os alunos possam adaptar-se ao mercado de trabalho depois. Não adianta o plano de estudos tentar correr atrás do mercado. É com uma boa base que se dá segurança aos formandos.
Pensando tanto como discente quanto docente, este "detalhe" é extremamente relevante e complexo. É fundamental que uma base sólida seja construída durante a graduação, pois permite que cada um navegue no que o mercado estiver pedindo quando chegar a hora. 
- Mas como aluno é horrível ficar estudando conteúdos de base. É desestimulante, e não adianta dizerem que aquilo é importante.
A tendência actual, incrustada nas agências de acreditação e nas comissões de avaliação, é considerar que o plano de estudos e os conteúdos das unidades curriculares são importantíssimos, que a presença ou ausência de uma determinada matéria podem afectar de uma forma grave toda uma geração.
Sou dos que discordo, hoje e sempre, desde o tempo em que faltava às aulas teóricas para ir jogar bilhar no Latino ou no Ceuta, e era apanhado pelo professor, que não percebia o nosso desinteresse.
É a vida!

quarta-feira, 30 de agosto de 2023

After You!

"Please, you go first, I will go after you".
Estava a ouvir um milionésimo comentário sobre o caso Rubiales (já nem sei como se chama senhora) e achei-me a pensar se ainda será normal deixar a minha vizinha entrar à minha frente no elevador, ou se isso já é um claro sinal de um machismo incurável.
E de repente recordei-me de um episódio passado comigo no Hotel Mandarin Oriental, em Macau, em 1998, antes da devolução do território à China.
Hotel Mandarin Oriental, Macau, 1998
Quando descia do quarto até ao rés-do-chão, pelo elevador, era normal haver um grupo de hóspedes a querer entrar, mas sem usar o preceito de deixar em primeiro lugar saír as pessoas que o pretendiam, e depois entrar calmamente. E eu, "educadamente", lá me desviava para os deixar entrar mesmo antes de eu próprio sair.
Comentei isso com um amigo meu que já estava em Macau há algum tempo, que me explicou que tal comportamento até podia ser visto como ofensivo aos olhos desses hóspedes, que mais não faziam que responder ao seu desejo instintivo de uma pequena brincadeira inofensiva matinal, do tipo "vê se consegues sair antes de eu entrar"...
Nunca mais me esqueci, e sempre olho para os usos e costumes de todos os países como o resultado da sua própria história e vida.

quinta-feira, 23 de março de 2023

Pessoas livres, educadas e cultas

Gostava de viver num país de pessoas livres, educadas e cultas.
Pessoas livres, que pensem pelas suas cabeças, sem medos.
Educadas, que saibam como funciona uma comunidade, um país, e que respeitem a identidade dos outros.
E cultas, que dêem valor à educação e à cultura.
Tudo menos a cultura do dinheiro e do poder, ou do medo e da intimidação.

domingo, 1 de agosto de 2021

Vêm aí as eleições...

Estamos num momento estranho da nossa vida política, com um governo cansado, o que não admira, dado tratar-se de um segundo mandato, em condições muito difíceis de uma pandemia para que não há soluções imediatas, e uma oposição, ou melhor, o maior partido da oposição, perdido, sem ideias, com medo de se apresentar como alternativa, tudo fazendo para que o poder não lhe caia nas mãos.
Com um líder que não serve, que não quer, que só vê fantasmas, a oposição está condenada a um fracasso gigantesco.
Mas a democracia exige que haja sempre uma alternativa em que os eleitores também acreditem, que a oposição tenha um líder que se preocupe mais em conquistar os eleitores do que conquistar o governo, pois sem essa clareza vão emergir, e estão a emergir, partidos que só vão confundir os eleitores, que só vão ajudar a perpetuar a solução existente.
Tarefa difícil a dos eleitores, de não dar uma perigosa maioria absoluta ao governo incumbente, e de enviar à oposição uma mensagem clara de que não serve, sem, ao mesmo tempo, fortalecer outros partidos do lado direito do espectro democrático que nunca serão solução para os nossos problemas.
Somos um país atrasado, precisamos de apostar tudo na Educação, dos novos e dos menos novos, para podermos competir em pé de igualdade com outros países pelo investimento em actividades com maior índice de produtividade.

Fonte: Eurostat, 2019

E a educação faz-se com professores, com professores motivados, com professores com autonomia, com professores cientes do seu papel na construção de um país melhor, com professores que saibam despertar nos alunos a vontade de aprender. 
Ora se há domínio em que governo e oposição estão a falhar, é este.

terça-feira, 20 de julho de 2021

Sim, algo está a acontecer...

E chama-se vacinação.
Aliás, um simples gráfico, que mostra a evolução do número de óbitos em simultâneo com a evolução do número de elementos da população já minimamente protegidos, isto é, recuperados, ou vacinados, com uma ou duas doses, permite perceber bem o efeito da vacinação na agressividade da doença:

População protegida e média móvel de óbitos de 7 dias

No cálculo destes números, tivemos o cuidado de considerar que os recuperados há mais de 6 meses são vacinados, e portanto não são considerado no número de recuperados.
Se, em vez dos óbitos, considerarmos as camas hospitalares ocupadas

População protegida e camas hospitalares ocupadas

podemos contunuara verificar o forte efeito da vacinação no alívio do esforço que se pede aos hospitais do SNS.
Assim, e não obstante a variante Delta ser a responsável pela maioria dos contágios, parece que o avanço da vacinação não pode deixar de ser considerada na regulação dos comportamentos susceptíveis de propiciar contágios.
As pessoas sabem avaliar os seus comportamentos, mas têm de ser treinadas na sua avaliação de risco, que, no fundo, passa por uma contabilização dos contactos de risco que cada um tem em cada dia, e por uma consciencialização de que esse número deve ser tão limitado quando possível, e de que o uso de máscara reduz sempre a possibilidade de ocorrer um contágio.
Não é preciso aterrorizar as pessoas nem atirar-lhes com números e regras que não entendem.
Os jornalistas, os comentadores, os políticos, na sua maioria, bem que poderiam ter uma atitude mais positiva nesta matéria, em vez de se armarem em profetas da desgraça.