E já me vi em muitas situações à primeira vista hostis, pelo menos aos olhos de um europeu que não esteja preparado para compreender o sistema de vendas destes povos, seja no Norte de África seja na Turquia.
Nunca, mas mesmo nunca se deve perguntar por um preço e depois simplesmente dizer obrigado e virar as costas. É um insulto grave. Quem pergunta, quer comprar, e tem de estar preparado para regatear, ou oferecer um preço, ou pelo menos dizer que é muito caro.
Mas nunca, mesmo nunca, force o seu preço. O vendedor normalmente faz questão em ser ele a fixar o preço final da transação, pelo que devemos deixar margem de manobra para esse jeitinho final. É uma questão de honra para ele.
Uma vez , no Grand Bazaar em Istambul, vimos um tapete que nos interessava. Antes de entrar, combinamos entre nós que pagaríamos 200 € pela peça. Depois perguntei o preço. 1000, disse ele. Muito caro, disse eu. 800, disse ele, porque eu era o primeiro cliente do dia... Muito caro, disse eu. Fez umas contas na máquina de calcular, e pediu 600. Já perdia dinheiro! Não, disse eu. Ofereça, disse ele. 200 euros, disse eu. Ficou zangadíssimo, disse asneiras, mas não me pôs na rua... 400, pediu, só para se ver livre de mim. Não. 350. Não. 300. Não. 250. Era a última oferta dele. Não, e viemos embora. Veio atrás de nós. 210?!
Aceitei. Não podia violar a regra de ser o vendedor quem fixa o preço. É o pequeno jogo de que eles tanto gostam. Claro que se fica sempre com a sensação de que eles é que ganharam no negócio, mas isso...
Outro jogo que os vendedores sempre jogam é o jogo das nacionalidades. Eles sabem que negociar com um português, um espanhol, um italiano, um russo, são coisas completamente diferentes, pelo que precisam dessa informação. E se lhes dificultamos o acesso à informação, eles não gostam... Portugais? Ronaldo. Mourinho. (os nossos valores em alta...)
Finalmente, eles usam todos os estratagemas para tentar vender, mas são completamente pacíficos; é sempre possível dizermos que não estamos interessados e virmos embora sem problema. Dois pequenos episódios, um em Agadir e outro em Marraquexe, assim o ilustram.
Em Agadir, estávamos no ClubHotel Riu Tikida Dunas e pedimos um taxi para irmos a um centro comercial conhecido. O condutor logo perguntou o que queríamos comprar, nós dissemos que só queríamos ir àquele centro, ele disse que conhecia um sítio fabuloso para tapetes, e perante a insistência dele, aceitamos ir lá. Era longíssimo, fora da cidade. Vimos. Dissemos que não gostámos de nada e dirigimo-nos para a porta. Lá estava o táxi, mas sem condutor! Vieram-nos dizer que tinha chegado a hora das orações e ele fora à mesquita. Passados uns longos minutos, chega uma carrinha com novas cores de tapetes, e logo a seguir, o taxista! Tinha sido um estratagema para nos forçar a esperar. Não compramos nada, e viemos embora.
Em Marraquexe, eramos seis, e numa daquelas ruas que dão acesso à praça de Djemaa El-Fna, um marroquino impecavelmente vestido de branco aproxima-se e convida-nos a ver o estabelecimento dele, que parecia ser apenas uma pequena sala. Oferece-nos chá de menta, e leva-nos, para uma sala, e uma segunda, e uma terceira, e ao primeiro piso, e a mais salas, mostra-nos coisas lindíssimas, mas parte do grupo começou a sentir algum pânico resultante do facto de não saber mais como sair da loja. Disse ao homem: não vamos comprar nada, lamento; pode-nos indicar a saída, por favor? Certamente, disse ele, e saímos.
Não devemos confundir o nosso próprio desconhecimento dos hábitos com insegurança.
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