segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Negociar em Marrocos e noutros países...

Há quem goste e há quem deteste. Eu gosto. Nunca tive nenhum problema.
E já me vi em muitas situações à primeira vista hostis, pelo menos aos olhos de um europeu que não esteja preparado para compreender o sistema de vendas destes povos, seja no Norte de África seja na Turquia.

Nunca, mas mesmo nunca se deve perguntar por um preço e depois simplesmente dizer obrigado e virar as costas. É um insulto grave. Quem pergunta, quer comprar, e tem de estar preparado para regatear, ou oferecer um preço, ou pelo menos dizer que é muito caro.
Mas nunca, mesmo nunca, force o seu preço. O vendedor normalmente faz questão em ser ele a fixar o preço final da transação, pelo que devemos deixar margem de manobra para esse jeitinho final. É uma questão de honra para ele.

Uma vez , no Grand Bazaar em Istambul, vimos um tapete que nos interessava. Antes de entrar, combinamos entre nós que pagaríamos 200 € pela peça. Depois perguntei o preço. 1000, disse ele. Muito caro, disse eu. 800, disse ele, porque eu era o primeiro cliente do dia... Muito caro, disse eu. Fez umas contas na máquina de calcular, e pediu 600. Já perdia dinheiro! Não, disse eu. Ofereça, disse ele. 200 euros, disse eu. Ficou zangadíssimo, disse asneiras, mas não me pôs na rua... 400, pediu, só para se ver livre de mim. Não. 350. Não. 300. Não. 250. Era a última oferta dele. Não, e viemos embora. Veio atrás de nós. 210?!
Aceitei. Não podia violar a regra de ser o vendedor quem fixa o preço. É o pequeno jogo de que eles tanto gostam. Claro que se fica sempre com a sensação de que eles é que ganharam no negócio, mas isso...

Outro jogo que os vendedores sempre jogam é o jogo das nacionalidades. Eles sabem que negociar com um português, um espanhol, um italiano, um russo, são coisas completamente diferentes, pelo que precisam dessa informação. E se lhes dificultamos o acesso à informação, eles não gostam... Portugais? Ronaldo. Mourinho. (os nossos valores em alta...)

Finalmente, eles usam todos os estratagemas para tentar vender, mas são completamente pacíficos; é sempre possível dizermos que não estamos interessados e virmos embora sem problema. Dois pequenos episódios, um em Agadir e outro em Marraquexe, assim o ilustram.

Em Agadir, estávamos no ClubHotel Riu Tikida Dunas e pedimos um taxi para irmos a um centro comercial conhecido. O condutor logo perguntou o que queríamos comprar, nós dissemos que só queríamos ir àquele centro, ele disse que conhecia um sítio fabuloso para tapetes, e perante a insistência dele, aceitamos ir lá. Era longíssimo, fora da cidade. Vimos. Dissemos que não gostámos de nada e dirigimo-nos para a porta. Lá estava o táxi, mas sem condutor! Vieram-nos dizer que tinha chegado a hora das orações e ele fora à mesquita. Passados uns longos minutos, chega uma carrinha com novas cores de tapetes, e logo a seguir, o taxista! Tinha sido um estratagema para nos forçar a esperar. Não compramos nada, e viemos embora.

Em Marraquexe, eramos seis, e numa daquelas ruas que dão acesso à praça de Djemaa El-Fna, um marroquino impecavelmente vestido de branco aproxima-se e convida-nos a ver o estabelecimento dele, que parecia ser apenas uma pequena sala. Oferece-nos chá de menta, e leva-nos, para uma sala, e uma segunda, e uma terceira, e ao primeiro piso, e a mais salas, mostra-nos coisas lindíssimas, mas parte do grupo começou a sentir algum pânico resultante do facto de não saber mais como sair da loja. Disse ao homem: não vamos comprar nada, lamento; pode-nos indicar a saída, por favor? Certamente, disse ele, e saímos.

Não devemos confundir o nosso próprio desconhecimento dos hábitos com insegurança.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

O condutor de táxi

Foi na Tunísia, há seis anos.
Estavamos em Hammamet, muito perto de Nabeul, era quinta-feira, e no dia seguinte seria o famoso mercado de rua. Como se vai? Comboio, autocarro, táxi? Que diz a recepção do hotel? Não, é muito difícil. Vai muita gente. O melhor seria mesmo não ir...
No dia seguinte, pequeno almoço cedo, e rua, directos aos táxis vermelhos. Entramos, dizemos o destino, e lá vamos.
O condutor parecia simpático, e fazemos-lhe a proposta de nos vir buscar às 13:00, pagando nós antecipadamente a viagem. Fica surpreendido. Antecipadamente? Nem pensar! Pagam quando eu os vier buscar! Combinamos o local de encontro, e despedimo-nos.
Apesar de não termos ficado muito convencidos, às 13:00 lá estávamos. Muito gente, uma multidão. Cada táxi que chegava e largava passageiros era literalmente assaltado por dezenas de pessoas que precisavam de transporte. Até que chega "o nosso". Quase que desaparece rodeado de interessados. O condutor vê-nos. Olha para nós. E diz: "eu venho buscar aquelas pessoas!"
No caminho de regresso, contou-nos que estava a trabalhar desde as 4:00 da manhã, que só terminaria por volta das 20:00, tudo isto porque o sonho dele era um dia ser dono do seu próprio táxi. A meio do percurso, perguntou se não nos importavamos que parasse uns minutos, fez um ligeiro desvio, parou à porta de um supermercado e foi comprar o almoço.
Seguimos, chegamos ao hotel, pagamos e despedimo-nos. Uns 25 euros pelas duas viagens. E um condutor feliz, talvez porque acreditamos nele antes dele acreditar em nós.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Amor e desamor

As relações definem redes cujas propriedades podem ser estudadas com rigor a partir dessas relações. Interessantes são as redes de relações positivas e negativas: dois nós relacionados positivamente atraem-se e dois nós relacionados negativamente repelem-se. Amor e desamor.
Uma rede de relações positivas e negativas com três nós é muito interessante. Só tem três lados, e portanto só há quatro possibilidades: três relações positivas, duas positivas e uma negativa, uma positiva e duas negativas e três negativas. E o que acontece agora?
A primeira rede, com três relações positivas, é uma família unida, é estável, podem viver os três na mesma casa. A terceira rede também é estável, mas não unida. Origina duas subredes, uma com dois elementos, aqueles entre os quais há uma relação positiva, e outra com um único elemento, o caso isolado. E mesmo a quarta rede é estável, embora conduza a três subredes com um único elemento cada, cada um para o seu lado.
A segunda rede é instável, não há nenhum agrupamento de nós que produza uma solução estável, gera uma crise insolúvel enquanto uma das relações não mudar de sinal.
É um caso frequente no interior de muitas famílias: o Pai que se dá com a Mãe e com o Filho, o Filho que se dá com o Pai, e uma relação negativa entre Mãe e Filho. Não tem solução. Alguém tem de ceder: ou a relação negativa torna-se positiva, o que será raro, ou uma ligação positiva torna-se negativa, o que dá origem a duas subredes, uma com dois elementos e outra com um elemento. A separação.
Há um livro muito recente e muito interessante para se conhecer as regras a que estão sujeitas estas redes: Networks, Crowds and Markets, por Easley e Kleinberg. E que estuda o problema da instabilidade das redes de maiores dimensões, mais complexas. A ler, para aprender.